terça-feira, 7 de dezembro de 2010


“Quantas vidas tem que se perder?”

“Assim que vi caindo vi que era diferente de soro, só não vi que era vaselina. Logo que foi injetado, ela disse: 'mãe, minha língua está formigando, não deixa eu morrer’, e já começou a se contorcer”, conta visivelmente abalada e ainda sob o efeito de calmantes a dona de casa Roseane Mércia dos Santos Teixeira, de 38 anos, mãe de Stéphanie dos Santos Teixeira, de 12 anos, que morreu na madrugada de sábado por erro médico no Hospital São Luiz Gonzaga, em São Paulo.

"Mataram porque não leram o frasco”, diz Roseane se referindo à auxiliar de enfermagem que teria trocado o soro fisiológico por vaselina e, desta forma, causado a morte sua filha. Os dois frascos de líquidos incolores apresentados pelo hospital são idênticos, à exceção do rótulo.
“Foi incompetência”.

- Eu estou abismada, porque como pode um frasco de vaselina estar junto à medicação? Não existe isso. Por que esta vaselina estaria aí? Foi a enfermeira, ou auxiliar quem aplicou não prestou atenção no que estava administrando na criança”.


Na tarde desta terça-feira, Roseana abriu as portas de sua modesta casa na Vila Nilo, em Tremembé, extremo norte paulista, para contar como foram os últimos momentos com Stéphanie e o sofrimento por não poder atender ao pedido feito por ela de ficar viva.

A internação e o erro

Por volta das 15h de sexta-feira (3), a menina foi levada ao hospital por apresentar um quadro de diarreia e vômitos que, segundo a mãe, apareceram naquele mesmo dia. Depois de duas bolsas de soro, já estava mais animada. “Ela falou deixa eu brincar com seu celular e eu respondi para não jogar muito para não acabar a bateria”, afirma ela, acrescentando que a filha já estava para receber alta. “A médica disse que daria bolacha e chá para ela se alimentar e, se ela não vomitasse, iria para a casa”, diz.

Diante do repentino e instantâneo agravamento do quadro da menina ao ser colocada a 3ª bolsa, a equipe de enfermagem foi chamada e, segundo a mãe, imediatamente a agulha retirada. “Era tanta gente em volta dela, médicos...”, conta.

Segundo Roseana, em momento algum a equipe informou sobre o que havia acontecido. Pelo contrário, Roseane diz que foi avisada de que sua filha precisaria ser transferida para a Santa Casa de Misericórdia para “realizar uma ressonância e que estava sedada”.

“Ainda peguei nela, disse que iria sair dessa e tentei fechar os olhos que estavam abertos. Antes de saírem com ela na ambulância, perguntei para a médica: ‘Foi efeito da medicação?’, e ela: ‘Vamos ver, acho que foi’”, relata, tentando conter o choro.

Roseane e a tia-avó de Stéphanie, Rielza Glória da Silva, que foi quem esteve com ela na ambulância, reclamam da falta de informações sobre o estado de saúde dela. “Não falavam nada, não me deixavam entrar. Soube quando ouvi minha filha gritando: ‘A Stéphanie não’. Subi correndo”. Stéphanie deixou duas irmãs, Ingrid, de 14 anos, e Beatriz, de 6 anos.

Investigação

Roseane se diz capaz de identificar as enfermeiras e auxiliares que atenderam a sua filha, inclusive a que teria cometido o erro. No entanto, isso ainda não aconteceu de forma oficial. “Não dei certeza quando vi, era muita foto e muita coisa na minha cabeça”, diz ela, que pediu ao delegado José Bernardo de Carvalho Pinto, do 73º Distrito Policial, responsável pelo caso, para providenciar imagens maiores.

Nesta terça-feira, o delegado afirmou que intimou pelo menos 25 pessoas que estavam do plantão do hospital para prestar depoimento ao longo da semana. Em nota, a Santa Casa se disse "consternada" com a morte da criança e afirmou ter afastado os profissionais envolvidos no atendimento da paciente até a conclusão das apurações.

O Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp) e o Conselho Regional de Enfermagem (Coren) também abriram sindicância para investigar o ocorrido.

Planos interrompidos

Stéphanie dos Santos Teixeira concluiria a 6ª série do ensino fundamental no final deste ano. Pelos amigos e familiares, é descrita como uma pessoa alegre, prestativa e companheira. “Ela ficava muito comigo, era caseira, dormíamos na mesma cama”, diz Rosenane.

No próximo dia 15, a menina fazia planos de passar parte das férias na casa da avó que mora em Itanhaém, no litoral sul paulista. Gostava de ouvir música alta e dizia que queria ser DJ. “Não tenho mais lágrimas, mais palavras. É tudo muito triste”, afirma a mãe.

Familiares organizam para o próximo domingo uma manifestação em frente ao hospital onde ocorreu o caso. “Para que não façam isso com o filho dos outros”, completa a tia-avó Rielza.

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