terça-feira, 20 de outubro de 2009


Declaração de Nyélény – Foro Mundial pela Soberania Alimentar


Nós, mais de 500 representantes de mais de 80 paises, de organizações camponesas, agricultores familiares, pescadores tradicionais, povos indígenas, povos Sem Terra, trabalhadores rurais, migrantes, pastores, comunidades florestais, mulheres, jovens, crianças, consumidores, movimentos ecologistas e urbanos, nos reunimos com o povo de Nyélény em Selingue, Mali, para fortalecer o movimento global pela soberania alimentar.


O fizemos, tijolo por tijolo, vivendo em cabanas construídas a mão, segundo a tradição local e comendo a alimentação produzida e preparada pela comunidade de Selingue... Damos a nosso trabalho o nome de Nyeleni, como homenagem, inspirados na legendária camponesa maliense que cultivou e alimentou sua gente.

A maioria de nós somos produtores e produtoras de alimentos e estamos dispostos, somos capazes e temos a vontade de alimentar a todos os povos do mundo. Nossa herança como produtores de alimentos é fundamental para o futuro da humanidade. Este particularmente é o caso de mulheres e povos indígenas que são criadores de conhecimento ancestrais sobre alimentos e agricultura, e que são desvalorizados.


Para esta herança e esta capacidade de produzir alimentos nutritivos, de qualidade e em abundancia, se vêm ameaçadas pelo neoliberalismo e o capital global. Frente a isto, a soberania alimentar nos aporta à esperança e ao poder para conservar, recuperar e desenvolver nossos conhecimentos e nossa capacidade de produzir alimentos.

A soberania alimentar é um direito dos povos a alimentos nutritivos e culturalmente adequados, acessíveis, produzidos de forma sustentável e ecológica, e seu direito de decidir seu próprio sistema alimentício e produtivo. Isto coloca aqueles que produzem, distribuem e consomem alimentos no coração dos sistemas e políticas alimentárias, por cima das exigências dos mercados e das empresas.


Defendendo os interesses de, e inclusive às futuras gerações. Nos oferece uma estratégia para resistir e desmantelar o comércio livre e corporativo e o regime alimentício atual, e para ENCAUZAR os sistemas alimentários, agrícolas, pastoris e de pesca para a prioridade das economias locais e os mercados locais e nacionais, e outorga o poder aos camponeses e à agricultura familiar, a pesca artesanal e o pastoreio tradicional, e coloca a produção alimentícia, a distribuição e o consumo sobre as bases da sustentabilidade meio ambiente, social e econômica.


A soberania alimentar promove o comercio transparente, que garanta o ingresso digno para todos os povos, e os direitos dos consumidores para controlarem sua própria alimentação e nutrição.


Garanta que os direitos de acesso e a gestão de nossa terra, de nossos territórios, nossas águas, nossas sementes, nossos animais e a biodiversidade, estejam nas mãos daqueles que produzimos os alimentos. A soberania alimentar supõe novas relações sociais livres de opressão e desigualdades entre homens e mulheres, grupos raciais, classes sociais e gerações.

Em Nyéléni, graças a muitos debates e a intensa interação, estivemos aprofundando em nosso conceito de soberania alimentar, e temos intercambiado acerca da realidade das lutas de nossos respectivos movimentos para conservar a autonomia e recuperar nosso poder. Agora entendemos melhor os instrumentos que necessitamos para criar um movimento e promover nossa visão coletiva.

Em prol de quem lutamos?

Um mundo em que...

... todos os povos, nações e estados possam decidir seus próprios sistemas alimentários e políticas eu proporcionem a cada um de nós alimentos de qualidade, adequados, acessíveis, nutritivos e culturalmente apropriados.

... se reconheçam e respeitem os direitos e o papel das mulheres na produção de alimentos e a representação das mulheres em todas as instâncias de tomada de decisões.

... todos os povos de cada um de nossos paises possam viver com a dignidade de seu trabalho, e possam ter a oportunidade de viver em seus locais de origem;

... a soberania alimentar seja considerada um direito humano básico, reconhecido e respeitado pelas comunidades, os povos, os estados e as instituições internacionais;

... possamos conservar e habilitar as comunidades locais, zonas pesqueiras, paisagens e os alimentos tradicionais, baseando-se em uma gestão sustentável da terra, do solo, da água, das sementes, dos animais e da biodiversidade;

... valoremos, reconheçamos e respeitemos a diversidade de nosso conhecimento, alimentação, línguas e nossas culturas tradicionais, e o modo em que nos organizamos e nos expressamos;

... exista uma verdadeira reforma agrária integral, que garanta aos camponeses pleno direito sobre aterra, defendam e recuperem os territórios indígenas, garanta às comunidades pesqueiras o acesso e o controle das zonas de pesca e ecossistemas, que reconheça o acesso e o controle das terras e das rotas de migração de pastoreio garanta empregos dignos com salários justos e direitos trabalhistas para todos os trabalhadores, e um futuro para os jovens do campo, onde as reformas agrárias revitalizem a interdependência entre produtores e consumidores, garantam a sobrevivência da comunidade, a justiça econômica e social, a sustentabilidade ecológica e o respeito pela autonomia local e a governanza com igualdade de direitos para as mulheres e os homens


... onde se garanta o direito aos territórios e a autodeterminação de nossos povos;

... compartilhamos nossos territórios em paz e de maneira justa entre nossos povos, sejamos nós camponeses, comunidades indígenas, pescadores artesanais, pastores nômades e outros;

... em se vivendo catástrofes naturais e provocadas pelas pessoas, e situações posteriores aos conflitos, a soberania alimentar atue como uma autêntica garantia que fortaleza os esforços de recuperação local e diminua o impacto negativo.


Em que se tenha presente que as comunidades afetadas desamparados não são incapazes, e onde uma sólida organização local para a recuperação por meios próprios constitua a chave para a recuperação;

... se defenda o poder dos povos para decidir sobre suas heranças materiais, naturais e espirituais.

Contra que lutamos?

O imperialismo, o neoliberalismo, o neocolonialismo e o patriarcado, e todo sistema que empobreça a vida, os recursos, os ecossistemas e as agentes que os promovem, como as instituições financeiras internacionais, a Organização Mundial do Comércio, os acordos de livre comércio, as corporações multinacionais, os governos quer que prejudicam a seus povos;

O dumping de alimentos apreços abaixo do custo de produção na economia global;

O controle de nossos alimentos e de nossos sistemas agrícolas nas mãos de empresas que privilegiam os ganhos às pessoas, a sua saúde e ao meio ambiente;

Tecnologias e práticas que desgastam nossa capacidade de produção alimentária no futuro, danificam o meio ambiente e põe em perigo nossa saúde.


Estas últimas incluem os cultivos e animais trangênicos, tecnologia terminator, aqüicultura industrial e práticas pesqueiras destrutivas, a chamada “revolução branca” e as práticas industriais no setor lácteo, as chamadas “novas e velhas revoluções verdes”, e os “desertos verdes” dos monocultivos e agrocombustiveis industriais e outras plantações;

A privatização e a mercantilização dos alimentos, serviços básicos públicos, conhecimentos, terras, águas, sementes, animais e nossos patrimônio natural;

Projetos/modelos de desenvolvimento e industrias de extração que despejam, expulsam a população e que destroem nosso meio ambiente e nossa herança natural;

Guerras, conflitos, ocupações, bloqueios econômicos, fome, despejos forçados e confiscação de suas terras, e todas as forças e governos que os provocam e os apóiam; e os programas de reconstrução após conflitos e catástrofes que destroem nosso meio ambiente e capacidades;

A criminalização de todos aqueles que lutam por proteger e defender nossos direitos;

A ajuda alimentaria que encobre o dumping introduz OGMs comunidades locais e os sistemas alimentários e crie novos padrões de colonialismo;

A internacionalização e a globalização dos valores paternalistas e patriarcais que marginalizam as mulheres e as diversas comunidades agrícolas, indígenas, pastoris e pesqueiras no mundo;


Que podemos fazer e faremos a respeito

Da mesma maneira em que estamos trabalhando com a comunidade de Selingue para criar um espaço de encontro em Nyéléni, nos comprometemos a construir nossos movimentos coletivos para a soberania alimentar, construindo alianças, apoiando nossas diferentes lutas e fazendo que nossa solidariedade, força e criatividade cheguem aos povos de todo o mundo que tem um compromisso com a soberania alimentar.


Cada luta pela soberania alimentar, independentemente em que lugar do mundo se libere, é uma luta de todos.

Acordamos uma série de ações coletivas para compartilhar nossa visão de soberania alimentar como todos os povos do mundo, que estão detalhadas em nosso documentos de síntese.


Levaremos a cabo estas ações em cada uma de nossas respectivas áreas locais e regiões, em nossos próprios movimentos e conjuntamente em solidariedade com outros movimentos.


Compartilharemos nossa visão e nossa agenda de ação para a soberania alimentar com aqueles que não puderam estar conosco em Nyéléni, para que o espírito de Nyéléni se dissemine em todo o mundo e se converta em uma poderosa força que faça da soberania alimentar uma realidade para os povos de todo o mundo.

Por último, damos nosso apoio incondicional e absoluto aos movimentos camponeses de Mali e ao ROPPA em sua luta para que a soberania alimentar se converta em uma realidade em Mali e em toda África.

É hora de Soberania Alimentar!!

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