quarta-feira, 14 de outubro de 2009




Esquerda na America Latina


Nos anos 90 ocorreu uma conversão da América Latina ao neoliberalismo. Com a queda do Muro de Berlim, a esquerda se desarticulou sob o impacto da globalização. "Mesmo lideranças expressivas abandonaram a esquerda ou admitiram premissas neoliberais para buscar vitórias eleitorais".

Na metade da década de 90, a América Latina retrocedeu em todos os indicadores sociais: aumento do desemprego, queda nos índices de saúde e de escolaridade, crescimento da violência e da instabilidade.

O neoliberalismo, por sua vez, embora tenha tido o senso de oportunidade de criticar corretamente as distorsões sofridas por um aumento descontrolado do Estado, é uma visão conservadora, que acredita no mercado como um instrumento milagroso de coordenação econômica, e que tem como objetivo utópico o Estado mínimo.

Neoliberalismo não é ser a favor de disciplina econômica e reformas orientadas para o mercado, mas acreditar que o mercado possa ser o único coordenador da economia. O verdadeiro neoliberalismo é contra qualquer intervenção do Estado da economia. É contra política industrial e tecnológica, e até mesmo contra política social.

Surge então, em protesto a essas reformas neoliberais, em varias partes do mundo movimentos sociais de resistências ao mundo capitalista. Os anos 90 foi uma década marcada por inúmeras manifestações de repúdio às políticas neoliberais impostas principalmente pelo imperialismo americano.

Todo esse cenário apontou a necessidade emergente de um movimento de resistência de caráter mundial para além das fronteiras nacionais. Um espaço internacionalista para reflexão e organização de todas as pessoas que se contrapõem às políticas neoliberais. Um movimento que, para além da crítica radical ao capitalismo, fosse capaz de reunir forças para a construção de alternativas coerentes e viáveis para o combaté às mazelas típicas do capitalismo. Um movimento que se propusesse a priorizar o desenvolvimento humano e a superação da dominação dos mercados dos países ricos sobre os chamados países de terceiro mundo.Desse desejo é que, em 1999, surgiu a proposta de se realizar o Fórum Social Mundial. Logo se tornou consenso que o evento se desse paralelamente ao Fórum Econômico Mundial (FEM), realizado anualmente em Davos, nos Alpes suíços.

Começa então a partir daí, acontecer na América Latina, O Fórum Social Mundial, a principio na cidade de Porto Alegre, no sul do Brasil, e 2005, em Caracas , na Venezuela, assim como em outros continentes.
A década de 90 é marcada por grandes mudanças, é a partir dessa década que a esquerda começa a se destacar mostrando sua insatisfação com as políticas que regiam o continente. O reflexo dessa insatisfação só e percebido e discutido pelos cientistas políticos e intelectuais no inicio dos anos 2000, quando vários paises apostam em governos de esquerda.

Nos últimos anos os estados latino-americanos têm experimentando governos com tendências esquerdistas. Paises como Argentina, Bolívia, Brasil, Uruguai, Venezuela, alguns menos outros mais radicais buscam alternativas para o imperialismo em seus territórios. O surgimento dos movimentos sociais (populares e de outra natureza de gênero, ecológicos, indígenas, de negros, de direitos humanos, etc.), são geradores de novos sujeitos sociais que fortaleceram a sociedade civil nas últimas décadas, trazendo práticas inovadoras que questionaram práticas tradicionais implementadas pelo Estado e pelo mercado, tais como o rompimento com vários privilégios.
O tema da ascensão da esquerda ganhou destaque entre os analistas e cientistas políticos , a partir das eleições ocorridas na América Latina no período recente, quando líderes identificados com as "causas populares" foram eleitos com ampla maioria de votos. Falou-se de uma "esquerdização" na América Latina, cujo sentido foi assim expresso por uma autoridade política:

O que há, sem dúvida nenhuma, é uma tendência de governos mais comprometidos com reformas sociais, com maior autonomia em relação às grandes potências do mundo e maior vontade de integração regional. Se você identificar esquerda com a visão de progresso, reforma social, democracia e com forte defesa dos interesses nacionais, a resposta à sua pergunta é sim.(AMORIM, 2006).

Depois de tantos anos submetidos às explorações de paises imperialistas, no inicio a Europa e depois os EUA, cansadas de viver uma situação de estrangulamento econômico, e muitas vezes teve sua soberania violada por essas potencias, a sociedade latina americana começa a buscar novidades para as urnas com esperança de mudanças do atual sistema.

Diante dos avanços dos movimentos populares, notadamente organizações indígenas, em todo o hemisfério, os dirigentes não poderiam menosprezar o diploma de progressismo e de independência dos Estados Unidos que pode conferir um apoio visível por parte de Hugo Chávez e Evo Morales. Além do mais, a amplidão das entradas de divisas que lhe proporcionam as suas exportações de hidrocarbonetos permite a Caracas conduzir uma diplomacia de influência, e não apenas na América Latina, como também em paises Árabes, que hoje são os principais inimigos dos Norte-Americanos.

O presidente Venezuelano hoje difunde em seu pais a chamada Revolução bolivariana. Conta com apoio de grande parte da população, de origem carente para fazer as reformas necessárias. Durante o Fórum Social das Américas que aconteceu entre 23 a 29 de janeiro de 2006, na capital, Caracas, apresentou aos intelectuais, estudantes, e membros de movimentos sociais de toda América Latina que estavam ali presentes várias conquistas de sua revolução. Tem entre alguns de suas prioridades inovadores programas sociais, que garantiram educação gratuita para um milhão de crianças pobres e a alfabetização de 1,2 milhão de pessoas, que resultaram na triplicação do orçamento na área da saúde e que distribuíram terras para 117 mil camponeses.

Além de garantir aos pobres, saúde gratuita, também estatizou uma rede de supermercado onde são vendidos produtos a preço popular nas comunidades mais carente. As razões para a popularidade de Chávez são óbvias. Nenhum regime anterior tinha este comprometimento com os pobres.

Podemos então qualificar que as reforma que Hugo Chavez propõe ao povo Venezuelano tem caráter revolucionário, segundo o conceito de Bresser citado no primeiro capitulo que diz
Quem quer acabar com a ordem é um extremista ou um revolucionário, que busca instalar uma outra ordem. Extremista se sua perspectiva for autoritária, se a ordem que busca destruir for democrática; revolucionário, se seu compromisso for com a democracia, se a ordem que precisa derrubar é opressiva. De esquerda, se seu objetivo for a igualdade plena, de direita, se sua aspiração maior for apenas restaurar uma ordem que julga perdida ou ameaçada. (1997 p.55)

Uma vez que foi eleito democraticamente pelo povo, e ainda tem o consentimento e a simpatia da grande maioria da população. Ao mesmo tempo em que, também pode-se qualificá-la, de Velha esquerda, segundo o conceito desse mesmo autor, quando diz :

A Velha Esquerda tem uma visão negativa do nacionalismo, convencida de que o país é cercado por potências imperialistas. Tem, em geral, uma atitude "contra" países avançados, vistos como "potências imperialistas", e prefere antes fechar o país à influência estrangeira a negociar interesses mútuos e conflitantes (2000p. 155)

Nestes termos pode-se dizer que impera hoje na Venezuela é uma esquerda, revolucionaria e velha, segundos os conceitos de Bresser.
O Chanceler Mexicano, Jorge Castañeda , atribui a guinada da esquerda na América Latina, nos últimos anos, uma conseqüência do reformismo econômico dos anos 90 não viu a massa de excluídos que fermentava na América Latina e hoje coloca a centro-esquerdo no poder. Em uma entrevista publicada no Estado de São Paulo em 30 abril 2006 ele responde essa questão afirmando que :

Por um lado, as reformas econômicas realizadas no período da democratização não produziram os resultados prometidos às pessoas. O Chile é exceção. Por outro lado, os governos desse período produziram resultados positivos em termos de democracia. Se você permite que as pessoas votem livremente em países cujas economias não prosperam, não é portanto um milagre haver um movimento para a esquerda.Aconteceu na Europa entre o fim do século 19 e a 2ª Guerra. E acontece hoje na América Latina. Os pobres, a grande massa dos excluídos, votam pelas políticas e para políticos que, assim esperam, os farão menos pobres.

Quando escrevi A Utopia Desarmada: a Esquerda Latino Americana depois da Guerra Fria (publicado em 1994) já estava claro para mim que, independentemente dos resultados das reformas econômicas então em curso em vários países, a combinação de mais democracia com a desigualdade no acesso à renda, à riqueza, ao poder e às oportunidades, que é maior na América Latina do que em qualquer outra parte do mundo, resultaria em governos de centro esquerda na região.

Afirma ainda que o que vemos hoje são duas esquerdas. De um lado, a "boa esquerda", que, paradoxalmente, é herdeira da esquerda tradicional, identificada com os partidos socialistas e comunistas do passado. Em graus variados, ela é reformista, moderna, está aberta a novas idéias. É também internacionalista. Estou falando aqui na esquerda do Chile, de parte da esquerda brasileira, de parte da esquerda uruguaia. Ela busca a inclusão através de políticas sociais, da criação de empregos, de programas para melhorar a educação, a saúde, as condições e de organização das pessoas, respeitando os equilíbrios macroeconômicos básicos. É uma esquerda que busca resultados.

Chama a outra esquerda de herdeira do populismo, que é a contribuição da América Latina à ciência política e o que há de pior em nossa história. Aponta adjetivos como : nacionalista, barulhenta, mentalmente fechada. E qualifica como essencialmente, burra. Ao contrário da esquerda reformista, que aprendeu com os erros do passado, a esquerda populista não aprendeu nada. É diz que é esquerda só mesmo na retórica. Quanto sua atuação ele diz:
Na ação, nada oferece de novo. Repete os populistas do passado. Sua solução para os problemas é distribuir dinheiro público. É assim que tenta incluir as massas. É o que faz Chávez com a gente pobre dos ranchos de Caracas.

Ela dá dinheiro porque tem dinheiro, graças ao petróleo. Não está criando emprego, não está melhorando a educação, não está levando à redução dos níveis de pobreza. O mesmo ocorre com Kirchner, na Argentina. Ele não tem uma política econômica de geração de emprego, de busca de competitividade, de melhoria da educação. O que há é a redução dos pagamentos da dívida e distribuição do dinheiro por meio de programas assistenciais.

No que se refere ao Presidente Evo Morales da Bolívia Castañeda diz que É líder de um movimento camponês tradicional, latino-americano, que chega ao poder por uma série de ações um "pouco caudilhescas". Segundo ele Morales não vem da esquerda. Não vem nem da tradição da COB (Central Obrera Boliviana), nem do Partido Comunista, nem do trotskismo boliviano, que foi importante em seu momento. "Morales é um dirigente cocalero cuja força deriva em parte dos indígeneas, em parte de uma base popular entre os excluídos nas cidades, por razões que não têm muito a ver com fenômenos de esquerda". Vê como responsável da sua presença no poder os movimentos sociais. E não vê como democrática suas atitudes.

Referente a posição brasileira e dos demais paises latinos quantos ao anti-imperialismo Castaneda diz que "o Brasil é um país demasiado grande, demasiado sério, com demasiados interesses e demasiadas responsabilidades para jogar o anti -imperialismo". Esse é um jogo a que só permitem aos pequenos. Não vê com otimismo as relações entre o Brasil e a Venezuela, acredita que essa relação tende se desgastar, porque os interesses reais não são os mesmos. Não vê o Brasil como imperialista na região. Afirma que o presidente Venezuelano não honra com seus compromissos internacionais no combate ao narcotráfico e crime organizado.

Existe uma ausência de política americana voltada para América latina no momento pois os Estados Unidos estão preocupados com os paises árabes e o terrorismo, e nesse momento o que observa-se, segundo Castañeda no continente latina americano e um sentimento muito forte anti-americanismo. A política de Washington nesses países é claramente insuficiente. O projeto da Alca foi o centro da estratégia de Bush. Não importa se a Alca era boa ou ruim. O que importa é que fracassou. Também não há política ativa sobre narcotráfico. E os EUA parecem não fazer distinção entre as duas esquerdas que há hoje na América Latina.

O professor do Departamento de Economia do Trabalho da Universidade de Campinas (Unicamp) e especialista em salário mínimo, Cláudio Dedecca discorda da posição do autor Jorge Castañeda . Para ele a posição do Castañeda é típica da arrogância intelectual. Não reflete a dinâmica política da América Latina. Trata-se de uma posição que despreza a história recente do continente. Dedecca diz ainda que , fazer uma dicotomia entre a "boa esquerda" – que seria refinada e culta – e a outra, é muita pretensão.

Ele defende em um debate , publicado no jornal da Unicamp que :
O que tem de novo nesses movimentos de esquerda da América Latina é que quem faz não é a esquerda da gravata, dos representantes poliglotas, mas sim aquela que representa um povo que não teve oportunidade de se organizar e de falar o que pensa. A sociedade culta não só estranha como vê nisso uma imoralidade

E quando e quanto à posição de Castañeda ele discorda dizendo :
Essa posição conservadora do Castañeda não tem pé nem cabeça. Você pode até questionar os rumos que parte da esquerda está adotando, mas é inegável que as experiências brasileira, argentina, venezuelana, boliviana, além de outras, são avanços democráticos extremamente importantes para a América Latina, inclusive no sentido de conformar partidos políticos e esquerdas mais consistentes. Isso faz parte da democracia.
Pelos fatos apresentados pode-se constatar que os principais fatos que marcaram e projetaram mudanças políticas na América Latina, sobretudo durante a década de 90, tanto no âmbito político, como no econômico, encontram-se, em sua maioria, relacionados à ofensiva das políticas de cunho neoliberal que, neste período, avançaram significativamente nos países latino-americanos. Tais políticas, como se sabe, preconizam o conceito do Estado mínimo; o plano político e econômico se sobrepondo ao social; a descentralização, privatização e focalização das políticas sociais (pois as mesmas são vistas como o principal vilão dentro do contexto de extrema dificuldade do setor da economia), tendo os movimentos sociais potencial de relevância no que diz respeito à universalização das políticas públicas e uma maior democratização.

Ao analisar-se o quadro geral apresentado neste período de 3 décadas – caracterizado pela instabilidade financeira global, a queda dos indicadores sociais, o aumento do desemprego e a lentidão do crescimento econômico – percebe-se que o mesmo não foi favorável às políticas neoliberais. O crescimento da economia latino-americana em taxas muito baixas resultou em um aumento das disparidades observadas entre a América Latina e os países desenvolvidos

Observa-se ainda , o que estaria ocorrendo na América Latina seria uma crise de governabilidade, sem produzir um movimento uniforme na direção da esquerda. Em cada país, um "mosaico de respostas específicas a estruturas políticas decadentes e aos cada vez mais altos níveis de desigualdade social e exclusão social". Em termos de governabilidade, estamos atravessando um momento extraordinariamente difícil devido ao desmoronamento dos partidos tradicionais, as corrupções praticadas por políticos e o surgimento de movimentos sociais.

Durante o estudo, pode-se concluir que nos mais diferentes períodos e fases da historia, a esquerda estava sempre apoiada de algum movimento de resistência, até mesmo na década de 70, quando a esquerda estava totalmente esmagada , percebe-se vários movimentos de resistência contra as decisões dos militares, que naquele período, representava a direita.
Nos anos 80, com a retomada da democracia nos paises que eram dominados pelos regimes militares, vários intelectuais considerados de esquerda retorna aos seus paises depois do exílio, é a partir desse momento, volta existir liberdade de expressão política, é quando a esquerda começa a interagir no cenário político.

No final da década de 90 e inicio do século XXI, é quando a esquerda aparecer com maior representatividade, despertando entre cientista políticos e acadêmico interesse em explicar essa nova tendência que surgi na América latina, com uma proposta de combaté r as políticas neoliberais. Alguns desses estudiosos apostam nessa nova tendência, e vê com esperança a mudança de pensamento, outros discordam justificando que existe na América Latina uma tendência ao populismo e que a esquerda dificilmente conseguira se estabelecer. por Andrea Lucia de Souza Lima

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