quinta-feira, 16 de setembro de 2010


Em 2009 mensagens ateísta circularam em ônibus ingleses como resposta a uma série de propagandas religiosas veiculadas no transporte público da cidade. Um website cristão recrutava fieis usando trechos da Bíblia e quando a escritora Ariane Sherine foi conferir descobriu que estava destinada ao inferno para “toda uma eternidade de tormentos” por ser ateísta.

Achando tudo aquilo muito extremo e difícil de se provar, ela decidiu que os ateístas também deveriam se posicionar. “Se eu quisesse colocar um anúncio dizendo ‘Cuidado, há um enorme leão do zoológico à solta!’ ou ‘Os pedacinhos no suco de laranja não passam de plástico, não os beba ou você morrerá!’ definitivamente me pediriam provas disso”, ela escreveu no site de comentários do jornal The Guardian.

Os ateístas conseguiram £140,000 libras em doações, depois de uma campanha que visava arrecadar £5,000 libras, e usaram o dinheiro para colocar anúncios em 200 ônibus flexíveis de Londres (outros 600 por todo o Reino Unido).

“There’s probably no God. Now stop worrying and enjoy your life”, lê-se nos cartazes. A tradução literal é:
Deus provavelmente não existe, portanto pare de se preocupar e aproveite a sua vida.

“Eu acredito que eles têm o direito de propagar sua opinião assim como nós”, disse a aposentada Mary-Ann Foster. “Ainda que não concorde com ela, jamais diria que não podem dizer o que pensam. Mas acho triste essa vida sem fé e espero que as propagandas não convençam os jovens a deixar de lado o caminho de Deus,” ela concluiu em um papo tímido.

Já para Paula Helguero, uma italiana de fé católica, os ateístas “terão que acertar as contas por isso do ‘outro lado’”. O irlandês Dave O’Connor também não gostou da ideia, mas acredita que “aqui se faz aqui se paga”. Abdallah Jasmine foi mais conciliadora:
“Eu sou muçulmana e sou aceita na sociedade inglesa, portanto não vejo porque uma pessoa que acredita que não exista um Deus não possa ser”.

Vale dizer que a iniciativa, que teve início na capital britânica, seguiu para outras cidades do mundo. Grupos em Washington e Sidney já têm planos para ações similares.

Para expor esse ponto de vista o cientista inglês Richard Dawkins, professor de compreensão pública da ciência na Universidade de Oxford, publicou no final de 2006
"Deus, um Delírio".

Nele, Dawkins afirma que as
"religiões não são só coisas sem sentido, como monstros de espaguete voadores. Elas também são altamente prejudiciais à sociedade".

"Meu grande sonho é a completa destruição de todas as religiões do mundo",
dispara, com sua voz tranqüila, depois de dois minutos de entrevista.
"Mas eu sei que isso é ambicioso demais".

"Na verdade, eu quero atingir as pessoas que estão em cima do muro. Pensando no assunto, talvez elas percebam que não são religiosas". Radical ateu Dawkins é considerado um dos mais importantes intelectuais do mundo e um dos mais famosos divulgadores de assuntos científicos. Ele já publicou 8 livros, que venderam centenas de milhares de cópias e foram traduzidos em mais de 25 línguas, começando pelo best seller "O Gene Egoísta", de 1976.

Do gene ao gênesis

O livro revolucionou a área de biologia evolutiva ao explicar a Teoria da Evolução de Darwin pelo ponto de vista dos genes. De acordo com sua perspectiva, a seleção natural não favorece os organismos mais adaptados à sobrevivência, mas, sim, os genes mais eficientes em se multiplicar. Depois que Darwin provou que os seres humanos não foram criados à imagem e semelhança de Deus, eles evoluíram a partir de animais mais simples , Dawkins tirou os animais, as plantas e os seres vivos em geral do papel de protagonistas da evolução, afirmando que nós não passamos de máquinas de sobrevivência projetadas pelos genes. Agora volta sua bateria para Deus.

A maior parte das religiões afirma que estamos sendo acompanhados de perto por um ser superior e que isso dá sentido à nossa vida. Uma imagem tão confortante quanto sem sentido, na opinião de Dawkins. "Existe um propósito na nossa existência, que é a propagação do DNA. Pode não parecer muito nobre, porque não é o tipo de objetivo que as pessoas procuram", explicou em uma entrevista à BBC. Criado em um lar Anglicano, Dawkins descobriu que era ateu aos 17 anos, quando se convenceu de que a Teoria da Evolução de Darwin explicava o mundo muito melhor do que qualquer religião. Mas, só agora, aos 65 anos, decidiu se dedicar de corpo e alma (ops!) a uma cruzada pela ciência e contra o obscurantismo.

Seu objetivo é combater o poder crescente das religiões como forças absolutas e inquestionáveis, cita como exemplos o fundamentalismo islâmico e o que ele chama de talibã cristão nos EUA. "Supostamente os EUA são um Estado desvinculado de religião, mas George W. Bush está levando o país na direção de uma teocracia, dizendo que fala com Deus e que Deus lhe disse para invadir o Iraque", afirma.

O último iluminista

Para combater esse tipo de atitude, criou a Fundação Richard Dawkins para a Razão e a Ciência, que "tem como objetivo defender a ciência contra os ataques da ignorância organizada", definição que inclui tanto os defensores do ensino de criacionismo quanto as pseudociências (astrologia, homeopatia, ufologia etc.). A fundação pretende financiar pesquisas sobre a psicologia das crenças, apoiar a educação científica e ajudar a divulgação de idéias racionais.

Ele é o primeiro a reconhecer que suas opiniões são polêmicas. "Se você colocar meu nome no Google, vai encontrar um equilíbrio: há coisas muito negativas escritas por gente religiosa e coisas muito positivas escritas por gente não religiosa", se diverte. Ocorre que até entre os ateus existe gente que discorda de suas idéias, como o físico brasileiro Marcelo Gleiser.
"Acho que o Dawkins escreveu um livro provocativo para polarizar ainda mais as tensões entre ciência e religião, o que é inútil", reclama. "As pessoas se sentem ameaçadas pela ciência, achando que ela vai 'matar' os deuses. É essa distorção que os cientistas devem combater, e não a fé. A ciência não quer roubar Deus de ninguém", diz Marcelo.

Não há paz

Bem, não é bem isso que Richard Dawkins pensa. Ele discorda radicalmente da posição liberal de ateus como o paleontólogo Stephen Jay Gould, que afirmava que religião e ciência são assuntos que não se misturam e podem coexistir em paz, cada um ocupando partes diferentes da vida (e da mente) humana. Para Dawkins, isso não passa de duplipensamento, a técnica descrita por George Orwell no livro 1984:
"acreditar em duas coisas conflitantes ao mesmo tempo".

No caso, o Gênesis e a Teoria do Big-Bang.

Em sua opinião, essa posição conciliadora mais atrapalha do que ajuda. Quem não se opõe abertamente às religiões ajuda, com sua omissão, a fortalecer o poder que elas já têm. Ainda assim ele nega que seja um radical: "As pessoas acham isso porque já se acostumaram a falar de religião sempre pisando em ovos", argumenta. "É possível questionar e discordar de alguém sobre economia, esporte ou qualquer outro assunto. Quando se trata de religião, é proibido falar qualquer coisa."

Em termos: as religiões vêm, sim, sendo questionadas em vários livros sobre ateísmo lançados recentemente. Dawkins faz parte desse movimento, ao lado de pensadores como os americanos Daniel Dennett (autor de Quebrando o Encanto) e Sam Harris (autor de O Fim da Fé).

Em sua casa é possível ver várias dessas obras, que são citadas em Deus, um Delírio, pelas estantes, em cima das mesas e até mesmo no banheiro.

Movimento dos sem-deus

O cientista compara a situação dos ateus hoje em dia com a dos homossexuais nos anos 50. Para mostrar o preconceito contra as pessoas sem religião, ele cita uma pesquisa feita pelo Instituto Gallup em 1999. Segundo o levantamento, 95% dos americanos votariam em uma mulher para presidente, 92% em um negro ou judeu e 79% em um homossexual, mas apenas 49% colocariam um ateu na Casa Branca.

"Enquanto o número de judeus nos EUA é muito menor do que o de ateus, eles são muito mais poderosos, pois foram capazes de se organizar e criar lobbies políticos para defender seus interesses", diz Dawkins. "Os ateus americanos, que são entre 20 milhões e 30 milhões, não fazem isso."

Na verdade, é difícil até mesmo perceber que a quantidade é tão grande, porque muitos deles evitam manifestar publicamente sua ausência de crenças. "Muita gente veio me agradecer por ter escrito o que elas não tinham coragem de dizer", se anima Dawkins.
"Apesar de não ter escrito o livro pensando nessa conseqüência, agora eu acho que talvez a melhor coisa que ele pode fazer pelas pessoas é encorajá- las a sair do armário."

Ao que parece, a porta do armário foi arrombada: uma pesquisa feita em 2006 pela companhia Harris Interactive mostra que menos da metade dos ingleses, dos alemães e dos espanhóis crêem em Deus ou em algum tipo de ser supremo. Na França, são apenas 27% da população. No Brasil os números ainda são bem diferentes, mas dá para perceber que alguma coisa está ocorrendo (apesar de o questionário do IBGE não incluir a opção "ateu"). No censo de 1991, o número de pessoas que disse não ter religião foi de 4,7%. Já em 2000 esse percentual foi de 7,4%. Para Richard Dawkins, a pior coisa das religiões é a idéia de fé.

Andar com fé

A simples idéia de acreditar em algo que não pode ser provado é capaz de tirá-lo do sério, o que significa, para um britânico tão educado, levantar uma das sobrancelhas. "Fé é algo em que você acredita sem evidência. Pior: quanto mais absurdo o artigo de fé, mais virtuoso é o fato de se acreditar nele." Dawkins crê que a aceitação de dogmas pode levar a sérios problemas. "Disputas entre crenças incompatíveis não podem ser resolvidas com argumentos racionais", disse à revista online americana Salon.

"Cientistas discordam entre si usando fatos e evidências para decidir quem está certo. Mas é impossível argumentar racionalmente se você simplesmente sabe que o seu livro sagrado contém a verdade absoluta dita por Deus, e a pessoa do outro lado pensa a mesma coisa sobre o próprio livro. Não surpreende que, ao longo da história, fanáticos religiosos tenham lançado mão de torturas,execuções, cruzadas, jihads e guerras santas."

O pesquisador britânico Richard Lynn dedicou mais de meio século à análise da inteligência humana. Nesse tempo, publicou quatro best-sellers e se tornou um dos maiores especialistas no assunto. Nos últimos 20 anos, passou a investigar as relações entre raça, religião e inteligência. Ao publicar um trabalho na revista científica Nature, que sugeria que os homens são mais inteligentes, um grupo feminista o recepcionou em casa com o que ele chamou de salva de ovos.

O mesmo aconteceu quando disse que os orientais são os mais inteligentes do planeta. “Faz parte do ofício de um cientista revelar o que as pessoas não estão prontas para receber”, diz. Ao analisar mais de 500 estudos, Lynn disse estar convencido da relação entre Q.I. alto e ateísmo. “Em cerca de 60% dos 137 países avaliados, os mais crentes são os de Q.I. menor”, disse. Seu trabalho será publicado em outubro na revista científica Intelligence.

Já o físico inglês Stephen Hawking ,68 anos,diz que Deus não é “necessário” para explicar o Universo.

“Não é preciso invocar Deus para uma centelha inicial pôr o universo em movimento”, lê-se num trecho de seu novo livro, The great design (O grande projeto), cujo lançamento foi um sucesso nos Estados Unidos.

Hawking escreveu The great design com o físico americano Leonard Mlodinow, autor de O andar do bêbado.

Para Hawking, a descoberta de planetas orbitando outras estrelas é uma evidência que a Terra não tem nada de especial. “A Terra não foi cuidadosamente projetada apenas para agradar aos humanos”, diz ele. “O Universo pode surgir do nada. A criação espontânea é a razão por que existe algo em vez de nada, por que o Universo existe e por que nós existimos.”

É irônico notar que a mudança de postura de Hawking tenha se dado um ano depois que ele se aposentou da cátedra de matemática que já foi ocupada por Isaac Newton na Universidade de Cambridge, berço da teologia anglicana.

Hawking renegou Deus de modo explícito.

Sua atitude só pode ser entendida no contexto do novo ateísmo militante que tomou conta da intelectualidade anglo-saxã por iniciativa de gente como o escritor e jornalista anglo-americano Christopher Hitchens, o filósofo americano Daniel Dennett, o neurocientista americano Sam Harris ou o biólogo britânico Richard Dawkins. Com seu novo livro, Hawking passa a ocupar um lugar de honra nesse panteão de ateus.

Os escritores Richard Dawkins e Christopher Hitchens são defensores conhecidos do ateísmo e críticos ferrenhos da religião. Os dois disseram que moverão um processo contra o papa tanto na Justiça da Grã-Bretanha, país que o pontífice está em visita, quanto na Corte Penal Internacional, pelo seu papel nos casos de abusos sexuais envolvendo padres da Igreja Católica em diversas partes do mundo.

Hitchens é filósofo e cientista político pela Universidade de Oxford, e colunista de diversas publicações, como Vanity Fair, Harper's e Granta.


Embora a rainha Elizabeth seja a líder da Igreja no Reino Unido, o número de frequentadores de igrejas está cada vez menor, e os políticos estão cada vez mais dispostos a afirmarem que são ateus. Em 2003, quando um jornalista perguntou a Tony Blair, então o primeiro-ministro, sobre religião, seu porta-voz interferiu e disse: "We don't do God" ("Não falamos de Deus", em tradução livre). Após deixar o cargo, Blair se tornou católico.

Mais recentemente, Nick Clegg, membro do Parlamento e líder dos democratas liberais, disse que era ateu. Posteriormente ele disse ser agnóstico, grupo que não acredita em Deus, mas admite que Ele pode existir.


Discriminação
Uma funcionária da British Airways que foi proibida pela companhia aérea de levar pendurado ao pescoço um pequeno crucifixo durante seu trabalho com o público perdeu sua batalha nos tribunais.


Nadia Eweida, de 56 anos, que trabalhava no aeroporto londrino de Heathrow, processou a British Airways por discriminação depois que seus chefes lhe disseram que não podia continuar usando a corrente com o crucifixo porque violava o regulamento sobre uniformes da companhia aérea.

Um tribunal de Reading, no condado inglês de Berikshire, tomou uma decisão contra ela.

A companhia aérea argumentou que Eweida foi a única funcionária a se negar sistematicamente a cumprir o regulamento da British Airways sobre uniformes.
O tribunal chegou à conclusão de que a funcionária não podia se queixar de discriminação por religião e crença porque tinha sido aplicado a ela o mesmo tratamento que o resto do pessoal.
Após escutar o veredicto, Eweida expressou sua profunda decepção porque, segundo disse, tinha ido aos tribunais "em busca de justiça".

O caso

Seu caso deu lugar a uma forte polêmica no Reino Unido e algumas pessoas ameaçaram boicotar a companhia enquanto vários clérigos e políticos criticaram a decisão da British Airways.
A British Airways modificou finalmente o regulamento no ano passado de modo que agora permite a seu pessoal portar símbolos religiosos.

Antes dessa mudança de política e visto que Eweida persistia em sua recusa de tirar o crucifixo, a companhia lhe ofereceu um novo posto de trabalho onde não teria que usar uniforme, o que a permitiria continuar exibindo o símbolo cristão.

Eweida rejeitou a proposta e decidiu entrar na justiça após desprezar uma oferta de £ 8.500 libras da companha para resolver a questão fora dos tribunais.

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